Créditos: Divulgação
29-12-2025 às 09h07
Direto da Redação*
Uma descoberta inédita no litoral do Paraná está ampliando o conhecimento sobre a flora da Mata Atlântica e reforçando a importância das Unidades de Conservação (UCs) no país. Pesquisadores do Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais registraram, pela primeira vez no estado, a orquídea Bulbophyllum campos-portoi Brade, uma espécie endêmica do bioma e até então conhecida apenas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
A descoberta integra os resultados do Projeto Estudos da Restauração – Pesquisa, Estruturação e Planejamento, financiado pelo Programa Biodiversidade Litoral do Paraná (BLP). O projeto tem múltiplas frentes de pesquisa e conservação, que vão desde o levantamento florístico no Parque Nacional de Saint-Hilaire/Lange (PNSHL) para ampliar o conhecimento sobre a flora local até estudos de autoecologia (estuda as relações de uma única espécie ou de um indivíduo com o seu meio) de cinco espécies raras e ameaçadas. A iniciativa também desenvolve pesquisas sobre frugivoria (estudo de animais que se alimentam de frutos sem danificar a semente), fortalece viveiros florestais e impulsiona programas de restauração por meio da coleta e distribuição de sementes. Além disso, elabora planos de recuperação ambiental e define estratégias de enriquecimento florestal em áreas degradadas.
O achado ocorreu durante uma expedição de campo no PNHSHL, área protegida que abrange os municípios de Matinhos, Guaratuba, Morretes e Paranaguá, no Paraná. A espécie foi encontrada em maio deste ano, nas proximidades do Salto do Tigre, em Matinhos, a cerca de 120 metros de altitude. A Bulbophyllum campos-portoi apresenta flores verdes e labelo castanho com pontuações púrpuras, características que a diferenciam de outras espécies do gênero, como B. glutinosum e B. atropurpureum. O gênero Bulbophyllum é um dos mais diversos da família Orchidaceae, com mais de 2 mil espécies distribuídas em regiões tropicais. No Brasil, 60 já foram identificadas, sendo 17 delas na região Sul.
Segundo o engenheiro florestal Daniel Zambiazzi Miller, coordenador da pesquisa no Mater Natura, o novo registro representa um avanço significativo para a ciência. “Esse trabalho amplia significativamente o conhecimento sobre a flora regional e fornece informações inéditas sobre a distribuição de espécies. Até o momento, além da Bulbophyllum campos-portoi, foram mapeados outros dois novos registros para o estado, com artigos científicos em fase de elaboração”, explica.
Pesquisa em germinação e estudos de frugivoria
Além do registro de novas espécies, o projeto Estudos da Restauração – Pesquisa, Estruturação e Planejamento desenvolve experimentos de germinação e cultivo de plantas raras e ameaçadas de extinção, em parceria com o Laboratório de Sementes Florestais da UFPR. Os testes buscam identificar protocolos eficientes de produção de mudas, importantes para ações de restauração ecológica e recomposição de ecossistemas.
“O avanço nesse campo contribui para o aumento da diversidade utilizada na recomposição de ecossistemas e, consequentemente, para a melhoria da sua funcionalidade ecológica”, complementa o engenheiro florestal.
Outra frente da iniciativa são os estudos sobre frugivoria, que utilizam armadilhas fotográficas no solo e no dossel da floresta para registrar animais responsáveis pela dispersão de sementes, processo para a regeneração natural das matas. A pesquisa já identificou interações inéditas entre fauna e flora, contribuindo para a literatura científica e oferecendo subsídios para políticas de conservação.
O foco inclui espécies como a bocuva (Virola bicuhyba), que depende de aves e mamíferos de médio e grande porte, como sabiás, tucanos, araçaris, macucos, macacos-prego e queixadas, para dispersar suas sementes. A perda desses dispersores pode comprometer a sobrevivência da planta, gerando efeitos em cascata nos ecossistemas.
“Mais de 80% das espécies vegetais tropicais dependem de animais para a dispersão de suas sementes. Esse processo influencia diretamente a regeneração natural, a estrutura das populações e a dinâmica das florestas, gerando benefícios duradouros à biodiversidade e aos seres humanos”, explica Daniel, do Mater Natura.
Ao final do projeto, será publicada uma lista completa com todas as interações observadas, ampliando a compreensão sobre a dinâmica ecológica da Mata Atlântica. A descoberta foi descrita em um artigo científico publicado na revista Acta Biológica Paranaense, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Sobre o Programa Biodiversidade Litoral do Paraná
Criado em 2021, o Programa Biodiversidade Litoral do Paraná promove a conservação, a pesquisa e o uso responsável dos recursos naturais, fortalecendo Unidades de Conservação e impulsionando o desenvolvimento sustentável do litoral paranaense. Financiado pelo Termo de Acordo Judicial (TAJ) firmado após o vazamento de óleo ocorrido em 2001, o Programa transformou um passivo ambiental em investimento histórico em conservação: serão mais de R$ 110 milhões destinados a iniciativas estratégicas ao longo de dez anos.

