Créditos: Freepik
08-12-2025 às 10h14
Solange Mendes*
Quando criança, as coisas têm um tamanho e uma importância que só quando crescemos é que percebemos o quanto tínhamos a mente fértil para lembranças grandiosas. Não existe pessoa mais bonita e inteligente que sua professora; sua mãe é enorme; seu pai, um super-homem; sua casa, uma imensidão; o pé de manga e o de goiaba que você subia então… não tem altura igual!
Com o passar dos anos, as coisas mudam de proporção, é porque nem tudo é tão grande assim. Sua professora não é tão linda, nem tão sábia assim; sua casa parece que diminuiu; sua mãe, que antes te segurava, agora se apoia em seu braço para ter segurança; seu pai hoje fala manso e está mais caseiro e devagar; só os pés de manga e goiaba que mesmo continuando quase do mesmo tamanho, te fazem diminuto, sem acreditar que um dia você teve a coragem de subir em coisa tão alta.
Foi pensando nessas coisas, que outro dia eu vi como se transforma uma imagem em uma grande lembrança de criança. Fui a uma festa de interior, numa cidade chamada Ritápolis e lá pude conviver e ver um povo carinhoso, hospitaleiro e, acima de tudo, devoto do amor de Deus e de Santa Rita de Cássia. A cidade linda, florida e festiva, enfeitada com amor e alegria, trazia também a folia de seus vendedores ambulantes, de guloseimas e lembrancinhas, que alegravam os visitantes e, mais ainda, os pequenos, que naqueles dias não tinham tempo para nada, tantas eram as novidades. Parando numa porta onde estavam fazendo enfeites, resolvi dar minha contribuição ajudando, ensinando e aprendendo a fazer enfeites. Também entrei nos assuntos da cidade e fiquei sabendo da capa da Playboy, do rapaz “casador”, e do roubo e devolução de quem mais interessava ali: Santa Rita de Cássia.
De manhã, a igreja linda e florida, começam as festividades com o Bispo, do alto de seu poder e fé, e com os devotos velhos, adultos e crianças, todos irmanados na esperança de bênçãos divinas, enquanto os entreveros que só quem olha com carinho e curiosidade pode ver.
Algumas crianças, em locais estratégicos, quase ao pé do santo padre, começaram uma briga de palavras chulas, empurrões e até socos, o povo olhava para cima, imersos no andamento da missa, quando no meio da brigas esbarraram no apoio da Bíblia que caiu longe. Em seguida, outras crianças contritas, balançando o turíbulo com incenso, para dar cheiro e mais pompa, antecedendo o ofertório, os incautos continuavam lá, em tempo de ter os topetes chamuscados. Mães, se é que tinham, não apareceram em nenhum momento para acudir. As beatas mais próximas reclamavam da falta de educação, mas o Bispo na sua compreensão e bondade, carinhosamente acariciou a cabeça dos “anjos”, e as beatas só conseguiram uma atenção especial, depois de ter amargado uma fila. E os meninos, sem preocupar com a importância de tudo, foram buscar mais o que fazer.
Quando a noite caiu é que foi a epopéia. Seu Higino, ilustre cidadão de muitas histórias e vitórias, na arte de fazer mais bonita a festa, com a sua fábrica de foguetes, rojões e chuvas de prata, deu o toque de sonho na hora de festejar Santa Rita. Em um quadro que acendia para tudo quanto é lado, com todas as cores bonitas e brilhantes, parecendo estrelas cadentes, presas de um jeito que só ele sabe fazer, surgiu o retrato da santa, era mais ou menos da minha altura, e olha que sou baixinha. Os olhos do seu Higino brilhavam com o feito, e os dos meninos em volta brilhavam mais ainda. Ele, talvez por estar cumprindo mais uma tarefa, e os meninos por estarem vendo a coisa mais grandiosa que já viram, pois daqui a alguns anos, quando tiverem com a minha idade, aquelas imagens, na lembrança, serão maiores e mais brilhantes que os painéis iluminados da Times Square.

